Selecção e tradução por Júlio Marques Mota
Ulrich Beck: um sociólogo alemão contra a “Europa alemã.”
Devemos dizê-lo desde o início: o último livro de Ulrich Beck, A Europa Alemã, De Maquiavel a «Merkievel». Estratégias de Poder na Crise do Euro, de Ulrich Beck, edições 70 não vai revolucionar a reflexão sobre a União Europeia. Sente-se de certa maneira como se tenha sido um pouco “rapidamente feito, mediamente conseguido”. Como se o sociólogo quisesse simplesmente tomar e dar conhecimento do tempo. Se o edifício comunitário viesse a desfazer-se, poderia também Beck dizer-nos que “bem nos tinha avisado” e a seguir poderia carregar sobre Angela Merkel.
Eles vão todos fazer isso, os pós-nacionais idealistas: caluniar Merkel para melhor se descartarem. Eles explicar-nos-ão que a Europa morre de um ” não muita Europa ” e não de um “muito rápido, muito mal feito”. Eles vão dizer-nos que o que falhou, o que faltou, foi o grande salto federal. Que são os Estados-nação que erraram por muito quererem continuar a existir, a recusarem-se a autodissolverem-se na “grande máquina”, em suma, a estarem simplesmente lá, a quererem ser bem reais. É tão enervante, o real. E muito mais divertido estar a viver permanentemente um sonho.
Na verdade, Ulrich Beck gosta de sonhar acordado. Com milhares de boas intenções e medos que se sentem sinceros. Mas finalmente, com teatralidade desnecessária! Com declarações de princípios complicadas, ambíguas! E o que é suposto estar a fazer com sugestões tão vaporosas como:
-estabelecer um “contrato social novo” que deve “proteger esta grande liberdade cosmopolita dos ataques dos separatistas que aspiram a uma nova claridade com o retorno das fronteiras” (tudo isso?).
-compreender a “sociedade europeia” como uma ‘sociedade posnational de sociedades nacionais’ (e vice versa?),.
-estabelecer “entre o movimento de protesto e a vanguarda que é constituída pelos construtores da Europa, uma coligação que permita dar um passo de gigante para uma capacidade de acção transnacional’ (mais ainda?).
Falta apenas “a implementação da Paz Universal no respeito das diferenças”, a “realização do Amor Transcendental para lá das divisões” e “o aparecimento de uma República Europeia Plural no âmbito do desenvolvimento social e solidário”.
Em suma, a tradicional charabia messiânica .
O livro apresenta no entanto um interesse, totalmente bem resumido no título do livro. Se Beck evolui mais no mundo dos princípios evanescentes do que no da política, se é que não devemos esperar que ele ofereça alguma solução concreta para a crise da construção europeia, continua a ser instrutivo lê-lo, ler pela mão de um intelectual alemão uma genuína preocupação quanto ao processo de “Germanização” da Europa. E se berramos contra a ” germanofobia” quando é um francês que fala, sentimo-nos autorizados a louvar a lucidez sem concessões de um alemão a dizer ”não” a uma ’ “Europa alemã. “
Para o autor, portanto, sob a liderança de Angela Merkiavel (Merkel + Machiavelli: eh, Beck é um grande malandro), a Alemanha tornou-se hegemónica na Europa. Hegemónica politicamente, através da sua incrível saúde económica e da sua capacidade em se colocar , ou em se recusar a colocar-se a socorrer os países em dificuldades. Hegemónica em termos ideológicos, porque a ajuda é concedida apenas na condição de que os países do Sul aceitem algum tipo de “reeducação” e de se converter para a cultura da estabilidade alemã.
Mas hegemónica sem o ter querido. Um pouco por ausência e de maneira mal assumida. Guillaume Duval, o autor de Made in Germany, explica que os alemães “têm a liderança, mas eles não sabem o que fazer dela. Eles são como uma galinha que teria encontrado uma faca”. Como em eco, Beck responde: “o poder do Merkiavel baseia-se na vontade de não fazer nada, sobre a sua propensão para o não-agir-ainda, para o agir mais tarde, para hesitar”.
Uma Alemanha super-poderosa mas um tanto desajeitada, uma Alemanha embaraçada nesta União Europeia que ela queria lentamente e que é um pouco forçada a ” ocupar-se”, e ela não teria querido , por óbvias razões históricas, ocupar-se agora senão dos seus próprios assuntos: Esta é a imagem que se desenha sob a pena de Ulrich Beck.
Original e suficientemente bem visto para merecer que se lhe dê bastante atenção, para lá de algumas infantilidades do autor em torno da ideia de uma Primavera “Europeia ” que não parece possível para amanhã.
Ulrich Beck: un sociologue allemand contre « l’Europe allemande », texto disponível no blog : http://l-arene-nue.blogspot.fr/
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